A diabetes e eu

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Estou há bastante tempo afastada, mas hoje estava no Facebook e vi a mensagem de uma mãe falando sobre seu filho de 10 anos e divulgando o blog dele que ele estava voltando a escrever. O pouco que ela contou sobre a história dele me tocou e decidi escrever uma mensagem para ele escrevendo sobre o que eu já passei. Aí percebi que nunca tinha feito isso aqui de verdade e decidi transformar em um post. Espero que vocês tenham paciência para ler e qualquer coisa que queiram conversar estou aberta. Bom… então vamos começar….

Meu nome é Fernanda, tenho 21 anos e sou diabética há 10 anos. Tenho esse blog, no qual tento passar a minha visão sobre a diabetes com a explicação de tudo o que acontece no nosso corpo, novidades, entre outros. Decidi criar esse blog por ver como existem muitas versões de um mesmo assunto quando se trata da diabetes. E sempre quis passar que é possível viver bem com a diabetes sem nenhuma restrição, esse é o principal objetivo desse blog.

Pra começar, como minha médica Márcia disse há muito tempo para mim “a diabetes não é uma doença é apenas um problema”. E essa frase eu levei por toda a minha vida e eu de fato não me considero uma pessoa doente. Tenho apenas um problema com o qual tenho que lidar e cuidar todos os dias, assim como temos que nos alimentar pra viver, dormir ou qualquer outra coisa para nossa sobrevivência. Eu descobri que tinha diabetes quando tinha 10 anos. Emagreci 7kg e os outros sintomas eu não sentia porque sempre bebi muita água. A única coisa diferente na minha casa, foram formigas que apareceram no vaso do banheiro (minha glicemia estava tão alta que o açúcar estava sendo eliminado pela urina). Meu pediatra, na época, pediu um exame de sangue. Fiz e quando saiu o resultado minha mãe passou o resultado pelo telefone para ele. A única coisa que ele falou foi “corre para um hospital”.

Fomos para o hospital, fiz um novo exame de sangue e fui internada na UTI com quase 600mg/dL de glicemia. Mas não fiquei muito tempo por lá, passei menos de dois dias na UTI e depois fiquei no quarto. A partir daquele momento, comecei a tomar insulina e nunca mais parei. Minha vida mudou… Descobri que tinha uma “doença” que nem sabia direito o que era, a única coisa que eu sabia era que meu avô tinha, mas só isso. Sai daquele hospital tendo que enfrentar um novo mundo, que eu nem sabia direito qual era ele. Não sabia o que eu deveria fazer, nem como cuidar da diabetes. Minha primeira médica foi particular. E a primeira proibição foram dos doces. Eu era uma criança que não comia muitos doces, mas a partir daquele momento eu comecei a ter vontade de comer qualquer tipo de doce. Eu costumo dizer que naquela época eu era uma pessoa doente. Eu tinha algumas proibições, minha glicemia não era nem um pouco controlada (300/400 era meio que normal) e minha médica não dava muita instrução para mim. Minha sorte é que eu tinha pessoas ao meu lado: minha família e meus amigos. Todos me davam o maior apoio, não comiam doces na minha frente e me ajudavam com tudo. Mas isso não quer dizer que eu não tenha me perguntado várias vezes: “porque eu?”, “o que eu fiz para ter isso?”, entre tantas outras perguntas que tenho certeza que todos já se fizeram nessa situação.

Eu convivi com essa situação por algum tempo, até que minha mãe descobriu que uma amiga dela, que também tinha diabetes, passava no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Fomos descobrir como fazer pra entrar lá. Resultado, passei um ano em uma fila de espera. Até que me chamaram, foi nesse momento que minha vida mudou completamente.

Lá aprendi uma nova forma de viver, sem qualquer tipo de proibição. Eu podia realmente viver como uma pessoa “normal”. Não gosto muito de usar a palavra “normal”, porque isso induz que existem pessoas anormais. Mas na realidade cada pessoa é única, com suas diferenças, seu jeito, suas ideias e suas manias. Mas voltando… no hospital das clínicas, aprendi como viver bem, comendo de tudo e sem nenhuma restrição. Nesse período, eu descobri o que a diabetes trouxe de bom para a minha vida. Aprendi a controlar meus horários, comendo de 3 em 3 horas. Isso era meio que uma necessidade, porque se eu seguisse isso, aplicaria insulina menos vezes, que já eram muitas (7 vezes). Aprendi a ter mais responsabilidade comigo e com minha diabetes, porque se eu não me cuidasse, ninguém mais cuidaria e muitas complicações poderiam vir. Então nesse momento, eu decidi deixar de ser uma pessoa “doente” e comecei a tirar o que tinha de melhor em ser diabética.

Quanto as insulinas, inicialmente, quando ainda passava com a médica particular tomava dois tipos de insulina NPH e Rápida e tinha as quantidades tabeladas. Quando entrei no hospital das clínicas, comecei com Lantus e Rápida e fazendo contagem de carboidratos (e era por conta da contagem que eu podia comer de tudo). Nessa época tomava no mínimo sete picadas por dia e a cada vez que eu comia algo fora dos meus horários era uma picada a mais. Depois de um tempo, minha médica decidiu fazer um teste comigo, com a bomba de insulina durante um mês. Antes do teste eu não queria usar bomba, porque eu tinha medo e não gostava da ideia de um aparelho conectado a mim 24 horas por dias. Quando eu aceitei fazer o teste, não queria saber de trocar, adorei a bomba. Aí através de um processo contra o governo, consegui uma bomba para mim e todos os insumos gratuitamente. Foi outra mudança de rotina e na forma de viver. A partir daí, eu tive muito mais liberdade para me alimentar, inclusive eu acabei engordando. Podia comer de tudo em qualquer hora e isso não significava mais uma picada. No final, troquei sete picadas por dia por uma picada a cada três dias, além da maior liberdade nos horários para me alimentar. Foi um ganho e tanto. A troca para a bomba foi em um momento propício, porque foi exatamente quando estava entrando na faculdade, quando todas as minhas rotinas mudaram e viraram de cabeça para baixo, mas já falo mais do que acontecia com a minha vida pessoal. Depois de mudar para a bomba, minha qualidade de vida aumentou muito e em contraposição meus controles pioraram um pouco. Isso foi junto com uma mudança de rotina e de vida enorme, mas estou conseguindo reverter e estou quase chegando na casa dos 6 de hemoglobina glicada.

Bom… a diabetes atrapalhou em alguma coisa a minha vida? Não, em nada. Saio com meus amigos e vou em festas (não tanto, mas por escolha minha), estudo, vou me formar, trabalho, já namorei, vou a shoppings, restaurantes…. resumindo, a diabetes não me proíbe de fazer nada. Nunca sofri bullying por isso, meus amigos sempre tentam entender o que é e me apoiam. Já recebi apelido na faculdade por conta da bomba, mas tudo brincadeiras saudáveis. Minha família também sempre me ajuda. Nunca tive convulsão ou entrei em coma. Tenho problemas de visão (astigmatismo e hipermetropia) mas nada por conta da diabetes, é “meu” mesmo (sempre faço exames de fundo de olho).

Agora… sempre só tive momentos bons durante meu tratamento da diabetes? Também não. Momentos de stress e de ansiedade descontrolam minha glicemia. TPM, gripe e infecções igualmente. Já tive diversos problemas, um deles eu tive umas 10 vezes o mesmo tipo e ia no médico e eles sempre receitavam o mesmo antibiótico. Eu cheguei a não aguentar mais. Todos esses momentos foram difíceis e deixaram a minha glicemia louca.

Mas parando de falar de momentos ruins, todo mundo, diabético ou não passa por dificuldades. Eu costumo dizer que a diabetes pode ser um bicho de sete cabeças horrível ou pode ser um gatinho fofo, só depende do que queremos. Podemos ter a diabetes como nossa amiga ou como nossa inimiga. Eu preferi torná-la minha amiga. A maioria das pessoas que convivem comigo, ou não sabem que eu tenho ou se sabem nem lembram, porque eu não faço com que isso seja a pior coisa da minha vida. E também achar que é o perseguido por ter diabetes ou que a vida é injusta não adianta nada e também não vai mudar nada. Já que não tem jeito e temos que viver com a diabetes de qualquer forma, porque não viver do melhor jeito? Ter um blog me fez ver a diversidade das pessoas, e como elas convivem com a diabetes de formas totalmente diferentes e é por isso que estou aqui contando minha história. Se você chegou até aqui, o que eu tenho para dizer é que a diabetes não me define, nem é o mais importante na minha vida mas ela faz de mim quem sou hoje e de certa forma é muito importante para mim. Então não fiquem rejeitando a sua diabetes, por pior que seja, porque ela faz parte de cada um dos diabéticos e por enquanto não temos como mudar isso.

4 comentários sobre “A diabetes e eu

  1. Ola Fernanda, é Marisa mãe do Iago, a mesma do post que você leu e foi o motiva da sua publicação, que outras pessoas vejam também diabetes como bichinhos fofinhos que devem ser cuidados e não como monstro que os persegue dia a dia!

    Gratidão

    • Fernanda Bernardo disse:

      Se todo mundo visse a diabetes como bichinhos fofos a vida delas seria muito melhor e mais leve! Fico muito feliz que você tenha lido meu post 🙂

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